quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

Era Jesus um Cervejeiro?

Toda religião é cercada por mitos e rituais que nem sempre -quase nunca- correspondem fielmente à realidade, e, com o cristianismo, não seria diferente. O próprio Natal é um exemplo disso, comemoramos o dia 25 de dezembro como sendo a data do nascimento de Jesus, o que não é verdade. Já é consenso entre os estudiosos do Novo Testamento e da origem do cristianismo, que Jesus não nasceu no dia 25 de Dezembro. Na realidade, no dia 25 de dezembro já era comemorado pelos romanos o "Natalis Solis Invicti" ("nascimento do sol invencível"). Era uma festividade pagã destinada ao deus Mitra, um deus Persa muito popular em Roma, que acontecia no solstício de inverno. Até por volta do século IV os romanos eram pagãos, os cristãos eram poucos e perseguidos. O Imperador Constantino, porém, se converteu ao cristianismo, elevando o status da religião, e, para facilitar a assimilação da nova religião oficial e ao mesmo tempo "extinguir" a comemoração pagã, os romanos se aproveitaram da data que já era comemorativa e a "cristianizaram", a primeira comemoração do nascimento de Jesus em 25 de Dezembro se deu no ano de 354 d.C., mais de trezentos anos depois do nascimento e da morte do cara! Uma vez que a data exata de seu nascimento será para sempre um mistério, particularmente acredito que a escolha foi ótima, de uma certa forma continuamos até hoje a louvar o Sol, que é mais do merecedor de uma data comemorativa. 

Mas a motivação dessa postagem não é descobrir quando Jesus nasceu, muito mais nobre e polêmica, nós queremos é descobrir o que Jesus bebeu! O cineasta, ilustrador, músico e escritor português Afonso Cruz lançou há um par de anos um romance chamado "Jesus Cristo bebia cerveja". Na obra em questão, a personagem principal, Rosa, quer realizar o desejo de sua avó de conhecer Jerusalém, porém a neta não pode leva-la até lá e decide então trazer a Cidade Santa até a velha, para isso ela contará com a ajuda do professor Borja, um erudito que decide ajudar Rosa a recriar Jerusalém com uma condição: precisão histórica e fidelidade a detalhes importantes, dentre eles está o fato de que Jesus bebia cerveja e não vinho!

No livro o professor Borja é taxativo ao dizer: -"O que se bebia no espaço geográfico em que Cristo habitava era cerveja. O vinho era uma bebida de romanos, dos invasores. Cristo não iria beber a bebida dos ricos, dos opressores”. -Ainda que seja uma afirmação capaz de causar surpresa em muitos, este detalhe do livro não é mera liberdade artística, ele se baseia em estudos históricos e na realidade é inclusive bastante lógico. A produção de cerveja sempre esteve associada com a do pão, justamente por seus ingredientes serem os mesmos: trigo e cevada. E o pão era a base da alimentação na época e na região onde Jesus viveu, que não era produtora de uvas, seguramente ali também se produzia cerveja. Temos que nos lembrar de que a cerveja nessa época não era bebida com as mesmas finalidades com que a bebemos hoje, além de alimentar ela era uma fonte segura de hidratação (havia muita água contaminada), uma vez que era fervida em sua produção e por possuir álcool, ainda que em proporção bem inferior à das nossas cervejas. Estima-se que o teor alcoólico atingisse no máximo 3% devido à fermentação espontânea e incompleta. Essa fermentação incompleta também a deixava mais nutritiva. 
                
A importância da cerveja como fonte de hidratação na antiguidade era tamanha que durante a idade média na Europa, uma cidadezinha da qual não me recordo o nome, escapou quase ilesa da peste negra porque seu senhor feudal, esperto pra chuchu, decretou a proibição do consumo de água, substituindo-o pelo de cerveja. Como resultado a transmissão da doença diminuiu muito e a cidade pôde sobreviver à epidemia sem maiores danos. 
              
Mas voltando à época de Jesus, a cerveja seguramente era produzida e consumida, não como uma bebida alcoólica mas como alimentação diária e uma maneira segura de se hidratar. 

              
O vinho era a bebida dos romanos, povo que dominava a região, era de fato a bebida dos ricos e dos opressores, que por se considerarem superiores ao povo dominado, consideravam também sua bebida superior, repugnando a cerveja e colocando-a em uma posição inferior à do vinho, era a bebida dos bárbaros e selvagens ao passo que o vinho era a bebida das pessoas civilizadas. Segundo os romanos a cerveja era “um suco malcheiroso de cereal putrefato” que diziam causar mal hálito. 
                
Compreendendo todo esse cenário fica difícil imaginar como e porque Jesus optaria pelo luxo de beber vinho no lugar da cerveja. Primeiro porque não era nobre, era um judeu pobre como tantos outros que não possuíam condições e nem o hábito de consumirem vinho. E segundo porque seria uma atitude totalmente incoerente com sua filosofia e suas atitudes. 
                 
Por outro lado, para os romanos não era nada atrativa a ideia de um deus que bebesse cerveja no lugar de seu adorado vinho e depois de Constantino se tornar cristão, o resto dos romanos, que até então perseguiam os cristãos, também deveriam seguir o mesmo caminho. E eles, assim como os gregos, possuíam uma relação muito longa e profunda com o vinho, haviam deuses dedicados ao vinho que ainda eram cultuados e precisavam ser aos poucos esquecidos e substituídos por apenas um novo deus. Assim como os romanos extinguiram uma festividade pagã que comemorava o nascimento do Sol, substituindo-a por uma festa cristã de celebração ao nascimento de Jesus, substituíram também a bebida de Jesus pela sua bebida, criando assim um Ser muito mais "interessante" aos olhos romanos.
                

Nessa época o cristianismo era difuso, existiam vários grupos cristãos e suas crenças não eram exatamente iguais. No ano de 325 d.C., o Imperador Constantino reuniu os mais influentes bispos cristãos no famoso Concílio de Nicéia, uma reunião que deveria acabar com aquela bagunça e definir quais seriam as doutrinas oficiais do cristianismo. Foram vários os assuntos discutidos e definidos, entre eles, quais dentre os inúmeros livros que tratavam da vida de Jesus seriam considerados oficiais pela igreja. Política e Religião sempre se confundiram e prevaleceram os interesses dos Cristãos Apostólicos Romanos. Depois de selecionados os livros, os mesmos, que muitas vezes já vinham de traduções feitas por outros povos e já possuíam alguns erros, foram traduzidos para o latim pela Igreja Romana e sofreram algumas modificações, algumas acidentais em função do idioma, outras um pouco mais convenientes, Jesus beber vinho
 era não somente mais atrativo para o povo romano, como foi também uma baita jogada de marketing uma vez que Roma era produtora da bebida.


O primeiro milagre de Jesus, a transformação de água em vinho nas Bodas de Canaã, afirmam os historiadores que teriam sido os gregos responsáveis por um engano que perdurou por milênios. Os escritos originais possuíam uma expressão que significava "bebida forte" e que teria sido traduzida primeiramente pelos gregos como "vinho". Maurício Beltramelli ensina em aula que tive o prazer de assistir e também em seu livro "Cervejas Brejas e Birras" que até hoje em muitos colégios alemães esse milagre é ensinado aos alunos de maneira diferente da que conhecemos. Lá eles ensinam que a água teria sido transformada em cerveja e não em vinho! O que também faz muito sentido, sendo o vinho caríssimo na época e o casamento em questão, uma festa simples de pessoas humildes que não teriam condições de bancar fartas quantidades de vinho. 

Outro ponto interessante e ainda mais polêmico diz respeito à seita Nazarita. Quem fazia o voto de nazireno deveria deixar o cabelo crescer, evitar bebidas e alimentos provenientes da uva, não consumir bebidas fortes e não tocar em cadáveres. João Batista, primo de Jesus, é o último nazireno de que se tem registro na Bíblia, mas há quem defenda que Jesus também teria feito o voto de nazireno, o que explicaria o cabelo comprido e o consumo de cerveja, uma vez que esta não era uma bebida muito forte na época, tampouco era feita de uva. A proibição de tocar em cadáveres é o ponto mais polêmico dessa afirmação, se Jesus de fato tivesse feito o voto de nazireno, ou ele não estava lá muito preocupado com o juramento e seguiu ressuscitando os mortos, ou nunca houve milagre assim. 
             
Apesar de ser esta uma questão que provavelmente jamais será resolvida com certeza, se analisarmos todo este cenário torna-se bastante coerente pensar que Jesus, de fato, provavelmente bebia cerveja e não vinho. Além de ser a cerveja comprovadamente produzida e consumida naquela região e o vinho ser uma bebida estrangeira, cara e consumida pelos opressores, o cara era cabeludo, gente boa e cheio de idéias avançadas, faz muito mais o perfil de um cervejeiro do que dos esnobes bebedores de vinho, não?






sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Chope Blonde Ale

Amostra Maltes Utilizados
Ainda não postei nenhuma Brassagem por aqui para fazer jus ao nome do Blog, mas isso acaba hoje!
Não quero fazer um texto muito técnico para que todos possam aproveitar e não só os homebrewers, mas alguns detalhes mais específicos não podem ficar de fora para que o texto também possa auxiliar quem faz cerveja em casa.
A estreante será uma Blonde Ale que não vai para a garrafa e sim para o barril! É um estilo suave e refrescante, m
uito bom para se beber o dia todo em um churrasco.
Mas não é porque será uma cerveja fácil de beber que precisa ser sem graça, então para aumentar a complexidade aromática e de sabor, além da base de Maltes Pilsen (Inglês e Belga), decidi adicionar um pouco de malte Vienna (alemão), que além de contribuir para a cor dourada deverá aumentar a presença adocicada de malte na cerveja, dando toques de biscoito. E para deixar tudo um pouco mais interessante, Malte de Centeio belga, que também vai contribuir para a cor, além de dar um toque de sabor único de centeio.
      








O Lúpulo escolhido combina com a proposta da cerveja até no nome, é uma variante Australiana
 chamada "Summer" que possui um forte aroma frutado que remete a damasco e melão. Esses aromas deverão ser mais pronunciados depois que o processo de Dry Hopping estiver finalizado. Amargor não é uma característica que estou buscando nesta leva, apesar de o estilo pedir um nível de amargor que varia de 15 a 28 IBUs, que para cervejeiros mais experientes já não é um nível muito alto, para muitas pessoas mais pode ser amargor demais, então vamos deixar o nível de IBUs entre 9 e 10 que está dentro da faixa das populares American Lagers.
       


Starter
O lúpulo deverá ser notado muito mais no aroma do que no paladar, então optamos por uma cepa de leveduras Americanas que propicia um aroma muito limpo, perfeito para destacar o lúpulo. Como a produção foi de mais de 80 litros precisamos fazer a propagação das leveduras por um processo chamado "starter", para elevar o número de células viáveis que seriam inoculadas no mosto até a quantidade necessária. Para isso, ao invés de utilizarmos extrato de malte utilizamos o meio para Starter  da Dr.Yeast que é um laboratório brazuca de manipulação de leveduras. Além de fornecer o meio necessário para elas se reproduzirem possui uma tantada de nutrientes que eles prometem contribuir muito e em diversos aspectos com a fermentação.

       
       

A brassagem foi feita com recirculação constante de baixo para cima. O foco foi a "beta-amilase" que extrai açúcares mais fermentáveis dos grãos, gerando uma cerveja mais leve e refrescante. Tudo correu bem, a lavagem dos grãos foi feita por meio de Fly Sparge e seguimos para a fervura, que foi branda para evitar qualquer caramelização, o que não é desejado nesse estilo.

Utilizamos a técnica de "First Wort Hopping" para a primeira carga de lúpulos e as demais adições se concentraram todas no final da fervura já que não se busca amargor e sim aroma e sabor.





Terminada a fervura rapidamente resfriamos o mosto para 23 Graus ao mesmo tempo que o oxigenamos e em seguida inoculamos as leveduras.
A fermentação se iniciou em pouco mais de 12 horas após a inoculação e se manteve constante e vigorosa por mais de uma semana, agora a atenuação está finalizando e em breve iniciaremos o Dry Hopping para completar o aroma de lúpulo. Depois que isso acontecer atualizarei a coluna novamente com os detalhes e assim sucessivamente até finalmente beber esta danada.

















**Atualização***
Realizamos o Dry Hopping com o Summer e seguimos direto para a maturação.
Depois de maturar por cerca de 20 dias, filtramos, embarrilamos em 4 Kegs de 20L e realizamos a carbonatação forçada.

Finalmente pronto para ser bebido, está excelente!
Com espuma abundante e coloração dourado intenso, levemente turva em função do Dry Hopping, que funcionou como eu esperava pela quantidade de lúpulo usado, facilmente nota-se o aroma lupulado, porém é suave.
O sabor ficou deliciosamente complexo, pode-se perceber algo que quase lembra tuti-fruti em função do lúpulo e que logo da lugar ao sabor do Centeio e do malte Vienna. A carbonatação deixou a cerveja leve e refrescante, perfeita para ser bebida o dia todo. Está uma delícia!


       Dados Técnicos:

-Aparência: Coloração Dourada, suavemente opaca - SRM: 4,5 - EBC -9 - Espuma branca abundante e persistente.
-IBU: 9,5 - Este foi o único Atributo que ficou um pouco abaixo dos parâmetros do estilo, mas isso foi proposital. Como o chope será bebido por quem não tem o hábito de beber cervejas lupuladas, um amargor mais elevado talvez causasse estranhamento.
-Teor Alcoólico: 4.8% Abv



 
       

          
       

sexta-feira, 10 de outubro de 2014

Kölsch Abaixo de Zero

            Uma das primeiras coisas que aprendemos quando estamos iniciando no Universo Cervejeiro é que as temperaturas extremamente baixas não são tão aliadas da cerveja quanto costumávamos crer. Na realidade, apenas uma parcela dos diversos estilos de cerveja existentes é que são apropriados para serem consumidos "estupidamente gelados". Isso ocorre porque nossas papilas gustativas acabam sendo anestesiadas quando entram em contato com o líquido muito gelado, o que nos impede de sentir os sabores mais complexos que uma cerveja mais elaborada possui. 
             Mas o tema da postagem, apesar de ainda ser gelado, é outro, nessa semana subestimamos nosso novo fermentador e o resultado foram mais de 80 litros de Kölsch totalmente congelados, senhores! Precisamos descartar tudo, uma tragédia! 

Aviso: As imagens a seguir são fortes.



              Aconteceu o mesmo que acontece quando se esquece uma garrafa de refrigerante no congelador e ela congela completamente;  quando começa a descongelar, o xarope derrete primeiro e se separa da água, detonando a coisa toada. Aqui foi exatamente isso. Na foto ao lado, o que parece espuma na verdade é gelo. A água ficou congelada e o que derretou foi uma espécie de xarope de malte. 




               
              








 
              Precisamos circular água morna pelo fermentador para acelerar o derretimento pois levaria alguns dias até que esse negócio retornasse ao estado líquido. 
                   Pois é meus amigos, nem tudo são flores na vida do cervejeiro!


domingo, 22 de junho de 2014

Turistas alemães elogiam nossa Cerveja!

Mas são muitos simpáticos esses alemães... Por essa ninguém esperava!
A reportagem é da UOL:
"País tradicionalmente consumidor de cerveja e uma das referências quando o assunto é a bebida amarela, a Alemanha parece se sentir em casa no Brasil com as marcas nacionais. O padrão de exigência alemão não tem gerado críticas às marcas nacionais, muito em função do calor.
Neste sábado, antes do duelo contra Gana, em Fortaleza, os vários alemães que sofriam com o sol de cerca de 32º nos arredores do estádio se esbaldavam com as cervejas nacionais nos bares e vendedores não credenciados pela Fifa. Skol, Brahma, Nova Schin e Itaipava enchiam os copos dos alemães. E das dezenas questionados, nenhum reclamou.

"É muito boa a cerveja brasileira, você bebe e não fica bêbado. É bem diferente da Alemanha, onde nós tomamos um ou dois copos e já ficamos um pouco mais alegres", falou o alemão Markus Theis. "Cerveja no Brasil tem sido o nosso menor problema. Temos gostado bastante de todas elas", endossou seu companheiro Till Moog..
"Não dá para comparar em termos de sabor com a cerveja alemã porque vivemos em temperaturas frias e nossas cervejas são mais fortes. Mas, para vocês brasileiros e quem está nesse calor, elas têm um teor alcóolico ideal para um país como o Brasil. Na Alemanha são mais encorpadas, é diferente da cultura brasileira de beber cerveja", continuou Moog.
A alemã Claudia Jörg enchia o copo rapidamente com uma garrafa de 600 ml de Nova Schin ao lado do marido. Ela apontou ainda outras qualidades da cerveja. "É muito barato beber aqui no Brasil. Essas garrafas custam muito barato (o bar vendia por R$ 4,50). E o sabor é bem refrescante, adaptado para essa temperatura", falou.
Nos vários bares e barraquinhas que não são padrão Fifa só se viam pilhas e garrafas de cerveja para matar o calor dos torcedores alemães.
Bernd Beev trazia consigo um saco de latas amarelas da Skol comprada de um vendedor de isopor. Eram seis latas para três pessoas. Questionado se as outras duas não esquentariam, respondeu: "Aqui o calor é muito grande e bebemos rápido demais, não dá nem tempo de sentir ela ficar quente", falou."
 ->  Praticamente  um  "Beerfrigerante" pros germânicos boca de litro.  Se são delírios advindos do calor ou apenas os alemães totalmente contagiados pela farra brasileira nunca saberemos,  mas vejam só! Até os  teutônicos viram qualidade nas nossas cervejinhas, uma pena elas não serem ao menos puro malte...



quarta-feira, 12 de março de 2014

E a Lei de Pureza da Cerveja Alemã?


Os alemães e sua mania de pureza... Não se martirizem os que desconhecem o assunto, mas se você se interessa por cerveja é provável que já tenha ouvido falar de Reinheitsgebot. Brincadeira, com um nome horrível desses eu duvido que alguém se atentaria, mas provavelmente  “Lei de Pureza Alemã de 1516” ou “Lei de Pureza da Cerveja” você já ouviu ou leu em algum rótulo. Esta última é quase a tradução literal da bela e nada difícil de pronunciar expressão alemã citada acima.

Diz a lenda que o Duque Guilherme VI, da Baviera -região onde hoje se encontra Munique – depois de uma ressaca histórica -e não é?- oriunda de uma cerveja de má qualidade, se decidiu por promulgar o Reinheitsgebot, que além de tabelar preços e volumes de cerveja a serem vendidos, garantia a pureza da bebida, definindo quais os únicos ingredientes que poderiam ser utilizados na produção, que eram: Malte de cevada, Lúpulo e Água. Em 1516 as leveduras não eram conhecidas ainda e por isso não figuram nesse rol. A cerveja era fermentada de duas maneiras: naturalmente, por leveduras selvagens ou  misturando-se ao mosto um pouco da cerveja já pronta para iniciar a fermentação. Posteriormente, acrescentou-se à Lei de Pureza as Leveduras.  


Dessa maneira, acabou-se com a prática que estava se tornando comum de se acrescentar à cerveja, em busca de receitas diferentes, ingredientes as vezes nocivos à saúde e até ervas alucinógenas; uma vez que o Lúpulo era cultivado exclusivamente nos Mosteiros, a igreja podia controlar quem fabricava cerveja e garantir a qualidade, selecionando para quem forneceria o lúpulo.  Mas os reais motivos para a promulgação da Lei de Pureza, porém, vão além da simples preocupação com a qualidade da cerveja, o Reinheitsgebot tinha como objetivo impedir que outros grãos como trigo e centeio, que eram utilizados para a produção do pão, base da alimentação, fossem utilizados na fabricação de cerveja, pois isso estava fazendo com que o preço do pãozinho subisse. Posteriormente também o Malte de Trigo passou a figurar na lista de ingredientes permitidos.


Seguir a Lei de Pureza é sinônimo de uma Cerveja melhor?
Sim e não.
Cerveja nossa produzida acordo com a Lei de Pureza.
Sabendo que a Reinheitsgebot não permite nada além de malte, lúpulo e água, além das leveduras para a fermentação, quando encontramos uma cerveja que alega ser feita de acordo com a Lei de Pureza podemos concluir que se trata de uma cerveja Puro Malte. Como nossa legislação exige que a cerveja tenha 50% de malte de cevada apenas, quase a totalidade das cervejas comerciais brasileiras, para baratear os custos da produção, levam em sua fórmula grandes quantidades de cereais não maltados como arroz e milho, que por não serem maltados, são meras fontes de açúcar que se transformará em álcool, deixando pouco sabor residual e resultando em uma cerveja menos saborosa, mais aguada, com uma espuma pouco cremosa e quase sem nenhuma retenção, por essa razão acabam por se utilizar de produtos como conservantes e estabilizantes, proibidos na Lei de Pureza, para corrigir os defeitos. Essas nossas cervejas são na realidade American Lagers e Light Lagers, e não Pilsens, como normalmente alegam ser; esta última deve sempre ser puro malte.
 Por essa razão, em se tratando de cervejas mais comerciais, ser fabricada de acordo com a Lei de Pureza é uma garantia de uma cerveja, em regra, superior. Heineken e Bavaria Premium são exemplos de cervejas genuinamente puro malte que encontramos facilmente por aqui. Nem as "afamadas" Original e Bohemia são puro malte. 



Quando a Lei não vale Nada

O mérito e a excelente qualidade da escola cervejeira alemã não residem na pureza de sua cerveja, a Lei de Pureza de 1516 é na realidade um limitador criativo, os alemães se destacam por, apesar de haver uma Lei deixando bastante estreito o campo criativo para se criar uma receita, conseguirem ainda assim produzir cervejas de excelente qualidade e bastante diversificadas.
Mas quando falamos de cervejas especiais de alta qualidade,  a Lei de Pureza não significa muito. Se o objetivo é uma cerveja de excelente qualidade (o que sempre caminha junto com um preço mais alto) limitar os ingredientes é sem propósito, pois a cervejaria por si só busca por um produto de grande qualidade e que esteja dentro dos padrões da bebida, portanto se utilizará de bons ingredientes de qualquer maneira, apenas não se limitará.
A escola Belga por exemplo, tão tradicional quanto a alemã, é famosa por justamente se utilizar de outros ingredientes como cascas e condimentos, além de cereais não maltados, com a diferença crucial de usar estes cereais com o objetivo de conseguir efeitos positivos na cerveja e não o de baratear os custos.
         A escola americana então, mais moderna e transgressora, porém quase que igualmente influente, dá de ombros para a tradição dos antigos rivais de WAR® ao se utilizarem de mel, abóbora e leite, este último usado também pelos ingleses.

            Portanto, quando falamos de cervejas comerciais, as “Puro Malte” tendem a ser superiores. É interessante lembrar que uma cerveja produzida de acordo com a Lei de Pureza de 1516 sempre será Puro Malte, mas uma cerveja que se utilize de 100% de cereais maltados dentre seus grãos, não necessariamente estará respeitando a Lei de Pureza, pois ela pode levar outros ingredientes que não seriam permitidos pela Reinheitsgebot. Muitos estilos são ótimos justamente por levarem ingredientes diferentes, que quando utilizados da maneira certa resultam em cervejas tão boas quanto e até melhores do que as produzidas no estreito rigor da Lei de Pureza. Tudo vai depender da intenção do mestre cervejeiro, se a busca for por uma cerveja mais barata, a utilização de cereais não maltados prejudicará a bebida, se a intenção for dar à cerveja alguma característica positiva, se funcionar é bem vindo.


Blonde Ale produzida de acordo com a Lei de Pureza.

É isso aí, pessoal, todo canal que  fala sobre Cerveja eventualmente acaba tratando do tema da Lei de Pureza, então aí está a opinião dos Bravos Brassadores Bêbados sobre o assunto. Parafraseando o bilionário filantropo criador do Parque dos Dinossauros John Hammond e o nosso querido Rei do Camarote, “nada de poupar despesas na hora de selecionar os ingredientes da sua cerveja e tudo o que vier para “agregar valor” ta valendo!”










sexta-feira, 7 de março de 2014

Chernobyl Brown Ale - Parte I

          Já faz algum tempo que pretendo publicar artigos mostrando  passo a passo a elaboração das cervejas, mas os fermentadores estavam ocupados com outras levas que eu não havia registrado o suficiente para fazer uma postagem.
          Ainda não me decidi sobre como farei estes artigos, mas como quero publicá-los logo, não vou esperar até que a cerveja fique pronta para postar, primeiro farei uma espécie de review de algumas cervejas que possuem semelhança com a que desejo produzir e posteriormente vou postar um novo artigo com a Receita e a Brassagem e então vou atualizando a postagem a cada nova etapa, provavelmente assim ficará até mais completo. 
         Para elaborar uma receita, depois de pesquisar bastante sobre o estilo e os ingredientes, gosto de degustar algumas cervejas que possuam os mesmos ou pelos menos ingredientes semelhantes aos que pretendo utilizar, para conseguir entendê-los na prática e finalmente concluir a receita com base no que percebi e gostaria de produzir. 
          Para essa Brown Ale selecionei alguns rótulos que encontrei na prateleira do supermercado e que acredito possuírem uma ou outra características que desejo obter quando a cerveja estiver pronta. 

                                                                      

            BROOKLYN - BROWN ALE:
          Foi a única cerveja da lista exatamente no estilo da cerveja que pretendemos fazer, muitos cervejeiros a consideram uma das melhores Brown Ales do mercado, além de ter um preço acessível. De fato é excelente, de cor âmbar escuro, próximo ao tom de uma garrafa de cerveja, translúcida; nota-se no aroma suaves notas de torrado e caramelo e percebe-se também o aroma herbal do lúpulo. O mesmo acontece com o sabor, é possível sentir um suave amargor torrado e também de lúpulo. Espuma cremosa que diminui rapidamente, mas continua no copo até o fim. Boa Drinkability.







          EISENBAHN - RAUCHBIER
         Confesso que não conhecia o estilo (Rauchbier), escolhi esta por indicação da Livia e do Daniel, um casal de grandes amigos cervejeiros que me alertaram sobre o incrível sabor defumado dessa cerveja. A cerveja me surpreendeu, eles não exageraram ao dizer que parece carne defumada. Com pouca (pouquíssima) espuma - apesar de isso poder ser culpa minha, que talvez não tenha secado adequadamente o copo depois depois de beber a Brooklyn - e uma cor que lembra chá mate, acreditem quando digo que o aroma é exatamente o de carne defumada. E fica melhor: O sabor também. Não há descrição melhor, esta deliciosa cerveja tem cheiro e sabor de carne defumada. Pode parecer estranho, mas não é, é delicioso. Altíssimo drinkability, mal se nota o teor alcóolico que não é nada baixo, 6,5%. Perfeita para acompanhar petiscos sabor churrasco e carnes em geral. Não é exatamente o tipo de sabor defumado que procuro para esta Brown Ale, mas definitivamente farei uma Rauchbier em breve. 





          WAY BEER - CREAM PORTER
          Apesar de se tratar de uma Porter, cerveja que inclusive já fizemos, escolhi esta Cream Porter por sua prometida cremosidade oriunda de flocos de aveia não maltada. Com um delicioso aroma de café e toques de caramelo, não se nota tanto o lúpulo nem no aroma e nem no sabor, que também remete a café e caramelo. A espuma é média, porém se mantém no copo por bastante tempo e é muito cremosa. Sem falsa modéstia, me senti orgulhoso ao notar fortes semelhanças com a Chernobyl Brown Porter que produzimos alguns meses atrás. É mais cremosa, porém. Me lembrarei da aveia em nossa próxima leva de Chernobyl Brown Porter. 




                 EISENBAHN 5 ANOS - AMBER LAGER
         Se a Eisenbahn Rauchbier me surpreendeu positivamente, essa aqui teve o efeito oposto. É uma cerveja muito bonita, com uma bela cor de cobre, translúcida,  formação de espuma média mas que te acompanha até o fim. Quanto ao aroma e ao sabor, pelo fato de ter sido usada a técnica de Dry Hop, eu realmente esperava muito mais. O Dry Hop é usado para realçar o sabor e o aroma do lúpulo e não creio que foram muito bem sucedidos, é possível se sentir o aroma de lúpulo, mas nada muito pronunciado, quanto ao sabor, nota-se bastante o amargor proveniente dos Ácidos Alfa do lúpulo, mas não tanto o seu gosto. É uma cerveja boa, mas apenas isso, já não sei porque a escolhi rsrs.  







  COLORADO TITÃS - BROWN ALE COM LARANJA
          E para finalizar, mais uma Brown Ale, dessa vez, porém, uma que como alega a própria Colorado, transgride um pouco as regras e foge do rigor do estilo, algo que também pretendo fazer, mas de maneira diferente. É uma cerveja muito bonita, escura mas não preta, espuma levemente marrom de boa formação e muito cremosa. Percebe-se suavemente o torrado no aroma. Com um rótulo que chama tanta atenção para laranjas suculentas, pode-se pensar que talvez seja levemente cítrica ou frutada, ledo engano. A cerveja não leva realmente laranja ou suco de laranja como muitos podem vir a crer, mas sim casca de laranja seca, que tem como função dar um amargor que lembra o da bebida Cointreou. É uma cerveja boa, mas devido ao marketing que fazem com o fato de levar "laranja" na composição, pode acabar decepcionando algumas pessoas que talvez procurem pelo sabor da fruta, por outro lado, apreciadores de Cointreou vão gostar. 



          Algumas mais outras menos, todas são cervejas muito boas e recomendo todas, mas especialmente a Eisenbahn Rauchbier que é uma cerveja muito diferente e deliciosa. Até o próximo episódio onde postarei a receita da Brown Ale que vamos fazer e o resultado da Brassagem; neste mesmo BatCanal, não perca!








         

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

Cerveja Hidrata como Água e mais do "VI Simpósio Europeu de Cerveja e Saúde"

Prática muito conhecida, pelo menos no universo masculino, a de tomar aquela cervejinha marota depois de uma atividade física, principalmente depois de um futebolzinho. Tenho um amigo, aliás, que costumava levar o copo e a garrafa de cerveja para a beirada do campo para se hidratar. “É minha Gatorade”, dizia.
O "Sheldon" está até em dúvida se vai encarar essa Weiss rs
E não é que desde 2011, um estudo apresentado em Bruxelas no "VI Simpósio Europeu de Cerveja e Saúde", onde participaram especialistas em medicina, nutrição e alimentação da União Europeia, já havia provado que a teoria do nosso sedento companheiro não apenas estava certa o tempo todo, como também é recomendável! 
A pessoa a quem devemos nossa gratidão pela realização deste importante estudo é o pesquisador Manuel Castillo da Universidade de Granada. Ele desejava comprovar se o hábito de beber cerveja após a prática de atividades físicas era de fato saudável e a conclusão a que chegou foi de que uma quantidade moderada de cerveja "não prejudica a hidratação após o exercício". Tomar cerveja seria "a mesma coisa que tomar água", por isso é recomendado o consumo da bebida fermentada a todas as pessoas que não tenham nenhuma contraindicação.
Já o médico o médico Ramón Estruch, do Hospital Clínico de Barcelona, por sua vez, deu seu “show” ao afirmar que os resultados dos estudos mostram que o consumo moderado de cerveja "ajuda na prevenção de acidentes cardiovasculares, graças aos efeitos antioxidantes e anti-inflamatórios das artérias". Além disso, proporciona proteção contra fatores de risco cardiovascular, como diabetes, melhora a pressão arterial, regula o colesterol e previne a arterioesclerose, segundo a pesquisa. Para encerrar a participação com chave de ouro, Estruch ressaltou a importância de "consumir a cerveja dentro de um padrão de alimentação saudável,.”
Universo Masculino...tsc, tsc...
E representando a ala das mulheres, Maria Teresa Fernandez Aguilar, pesquisadora da Agência da Saúde de Valência, informou sobre os efeitos benéficos da cerveja sem álcool para as mães lactantes. Ela citou o estudo que demonstrou que crianças amamentadas por mães que consumiram duas cervejas sem álcool durante a lactação têm menos possibilidades padecer de doenças como câncer e arteriosclerose, devido à transmissão dos componentes antioxidantes da bebida. Lembrando mamães, nem toda cerveja dita sem álcool é de fato totalmente isenta de álcool, cuidado! A Brahma 0,0% é um exemplo de cerveja que é de fato sem álcool, e é tão "boa" quanto a Brahma normal.
Durante a conferencia, ainda, foi apresentado um estudo que descartou que exista qualquer relação entre beber cerveja e a famosa “barriguinha de chopp”. Na medida certa, e na medida errada aos finais de semana, uma cervejinha vai te trazer uma vida longa e feliz! Prost!